DOENÇAS
Perturbações Musculosqueléticas: Hereditárias do Tecido Conjuntivo ou dos Ossos

Algumas perturbações que afectam o tecido conjuntivo são hereditárias e incluem a Síndrome de Ehlers-Danlos, a Síndrome de Marfan, pseudoxantoma elástico, cútis lassa e mucopolissacaridose. As osteocondrodisplasias afectam os ossos ou as cartilagens, e as osteopetroses afectam os ossos.

Síndrome de Ehlers-Danlos

A Síndrome de Ehlers-Danlos é uma rara perturbação hereditária do tecido conjuntivo que origina flexibilidade articular extrema, pele muito elástica e tecidos frágeis.

Esta Síndrome apresenta diversas variantes, causadas por diferentes anomalias genéticas, que controlam a produção do tecido conjuntivo. Muitas crianças têm as articulações muito flexíveis (hipermobilidade benigna) sem outros sintomas. A flexibilidade tende a reduzir-se com o tempo.

Sintomas e Diagnóstico

A pele pode esticar-se vários centímetros, mas torna à sua posição normal quando é libertada. As articulações podem ser excessivamente flexíveis. Em geral, formam-se cicatrizes largas sobre as partes ósseas do corpo, particularmente nos cotovelos, nos joelhos e nas tíbias. Podem desenvolver-se pequenos nódulos, duros e redondos, sob a pele, que podem ser observados nas radiografias.

As lesões menores podem causar feridas grandes, habitualmente com pouco sangramento. Contudo, só algumas das pessoas com a Síndrome de Ehlers-Danlos tendem a sangrar com facilidade. Curar as feridas pode ser difícil porque os pontos de sutura tendem a rasgar o tecido frágil. Os órgãos do corpo também podem ser frágeis, causando problemas durante as intervenções cirúrgicas. As torceduras e as deslocações são frequentes. Aproximadamente 25 % das crianças desenvolvem uma corcunda com uma curva anormal da coluna (cifoescoliose) e 90 % desenvolvem pés chatos. As hérnias e protuberâncias anormais (divertículos) do intestino são bastante frequentes. Raramente um intestino frágil sangra ou é perfurado.

Uma grávida com essa Síndrome pode ter um parto prematuro porque os tecidos corporais esticam-se facilmente. Se o feto é afectado pela Síndrome, as membranas que o contêm podem ser facilmente perfuradas. Além disso, a cirurgia na grávida, como uma cesariana ou uma incisão na abertura vaginal (episiotomia) para facilitar o parto, pode ser mais difícil devido à fragilidade dos tecidos e pode manifestar-se uma hemorragia grave antes, durante ou depois do parto.

Prognóstico e Tratamento

Apesar de tantas e tão variadas complicações, o tempo de vida de quem sofre a Síndrome de Ehlers-Danlos é, geralmente, normal. Contudo, em alguns doentes, complicações como a perfuração de um vaso sanguíneo são mortais.

Não existe cura. As lesões devem evitar-se pela fragilidade dos tecidos. O uso de roupa protectora e acolchoada pode ser útil. Se as pessoas com a Síndrome de Ehlers-Danlos desejam ter filhos, é aconselhável assistência genética, para determinar o risco de as crianças herdarem esta doença.

Síndrome de Marfan

A Síndrome de Marfan é uma estranha perturbação hereditária do tecido conjuntivo que origina anomalias na vista, nos ossos, no coração e nos vasos sanguíneos.

Sintomas

O gene da Síndrome de Marfan prevalece (Ver secção 1, capítulo 2) naqueles que o herdam, mas não afecta todos por igual. Os indivíduos que têm esta Síndrome ultrapassam a média da altura para a sua idade e família. Neles, a envergadura dos braços (distância entre as polpas dos dedos com os braços em cruz) é superior à sua altura. Os dedos da mão são compridos e delgados. É frequente a deformidade do osso do tórax chamado esterno (situado na região anterior e média), o qual faz com que aquele sobressaia ou se afunde. As articulações podem ser muito flexíveis. São frequentes as hérnias, os pés chatos e a corcunda com curvatura anormal da coluna (cifoescoliose). Em geral, estes indivíduos têm pouca gordura sob a pele e o tecto do paladar muito alto.

Ambos os cristalinos podem estar deslocados. Mediante um oftalmoscópio, pode-se observar habitualmente o bordo do deslocamento na pupila. A pessoa pode ter uma visão confusa de perto, e a retina pode desprender-se (área sensível à luz localizada na parte posterior do olho).

O enfraquecimento da parede da aorta pode causar o alargamento gradual desta artéria principal, originando um aneurisma (protuberância da parede do vaso sanguíneo). O sangue pode passar entre as camadas da parede (dissecção da aorta), ou o aneurisma pode romper-se, causando uma hemorragia maciça. À medida que a aorta se alarga, a válvula aórtica que vai do coração à aorta pode começar a refluir (regurgitação aórtica). A válvula mitral, localizada entre a aurícula e o ventrículo esquerdos, pode refluir ou sofrer um prolapso (afundar-se para trás na aurícula esquerda). Podem desenvolver-se nos pulmões sacos cheios de líquido (quistos), que ocasionalmente se perfuram, causando um pneumotórax (ar no espaço que rodeia os pulmões), o que dificulta a respiração.

O risco de complicações depende, em grande parte, da gravidade das anomalias. O perigo principal é a ruptura súbita da aorta, a qual pode originar um desenlace mortal muito rapidamente. A ruptura é mais provável durante a prática de desportos enérgicos.

Diagnóstico e Tratamento

O médico pode suspeitar da Síndrome de Marfan se um indivíduo excessivamente alto e delgado tem algum dos sintomas característicos. Contudo, muitos dos que têm a Síndrome nunca desenvolvem qualquer doença estranha e não se lhes encontra qualquer anomalia.

O principal objectivo do tratamento é a prevenção dos problemas relacionados com os vasos sanguíneos e os olhos. A revisão da vista faz-se uma vez por ano. Uma pessoa com a Síndrome de Marfan deve recorrer o mais cedo possível ao médico se desenvolver qualquer problema relacionado com a visão.

Podem usar-se a reserpina ou o propranolol para reduzir a força da circulação do sangue e, deste modo, facilitar a prevenção do alargamento (dilatação) e dissecção aórtica. Se a aorta se alargar, a secção afectada, por vezes, pode ser reparada ou reposta cirurgicamente.

As crianças que sofrem da Síndrome tendem a ser muito altas. O médico pode, por conseguinte, recomendar uma terapia hormonal (estrogénio e progesterona) para as raparigas muito altas. Esta terapia administra-se habitualmente com a idade de 10 anos, provocando uma puberdade precoce, com o que se detém o crescimento.

Os indivíduos com a Síndrome de Marfan que pretendem procriar devem procurar aconselhamento genético para determinar os riscos hereditários.

Pseudo-Exantema Elástico

O pseudo-exantema elástico é uma perturbação hereditária do tecido conjuntivo que afecta a pele, os olhos e os vasos sanguíneos.

O pseudo-exantema elástico afecta principalmente as fibras elásticas, o que permite que o tecido se estique e torne logo ao seu lugar. Produz uma pele grossa e estriada, pouco flexível e frouxa no pescoço, sob os braços, na virilha e em torno do umbigo. As pequenas saliências amareladas dão à pele um aspecto de pele de galinha. As mudanças na parte posterior do olho (retina) podem originar perda grave da visão e inclusive cegueira. As artérias podem estreitar-se, provocando dor no peito e claudicação intermitente (dor da perna durante a actividade física causada por um inadequado fornecimento de sangue). Podem produzir-se hemorragias nasais e cerebrais, uterinas e intestinais. A hipertensão é habitual.

O prognóstico depende da gravidade da perturbação e das artérias afectadas. As complicações habitualmente causam a morte entre os 30 e os 70 anos.

Cútis Lassa

A cútis lassa é uma perturbação rara do tecido conjuntivo em que a pele se estica facilmente e fica pendente em pregas moles.

A cútis lassa afecta principalmente as fibras elásticas. É habitualmente hereditária; contudo, em poucos casos e por razões desconhecidas, desenvolve-se em pessoas sem história familiar desta perturbação. Algumas formas hereditárias são bastante leves, umas causam atraso mental e outras podem ser mortais.

Sintomas

Nas formas hereditárias, a pele pode ser muito lassa desde o nascimento ou pode afrouxar depois. Este sinal é particularmente óbvio na cara, e as crianças afectadas parecem assustadas e têm as bochechas caídas. O nariz em forma de gancho é um sinal característico. São frequentes as hérnias e protuberâncias (divertículos) intestinais. Um alargamento dos espaços aéreos nos pulmões pode causar alta pressão arterial nestes últimos (cor pulmonar).

A forma não hereditária (adquirida) apresenta sintomas diferentes dos da hereditariedade. Inicia-se mais tarde e afecta zonas mais extensas da pele. A superfície cutânea afectada adquire um aspecto diferente do da pele nas formas hereditárias e o nariz não tem forma de gancho. Em crianças ou adolescentes, a cútis lassa pode começar como uma doença grave com febre, inflamação dispersa nas membranas do corpo e uma erupção grave na pele (eritema multiforme). No adulto, esta perturbação pode desenvolver-se gradualmente. Por vezes, provoca complicações pulmonares ou a morte por ruptura aórtica.

Diagnóstico e Tratamento

Em geral, pode-se diagnosticar a cútis lassa mediante um exame cutâneo.

Esta Síndrome não tem cura. Para quem apresenta uma forma hereditária, a cirurgia plástica pode melhorar consideravelmente a aparência. Contudo, a pele pode tornar a dilatar-se. A cirurgia plástica tem menos êxito na forma adquirida. Os problemas pulmonares, como enfisema ou pressão arterial pulmonar elevada, são tratados de acordo com a necessidade.

Mucopolissacaridose

A mucopolissacaridose são perturbações hereditárias que causam uma aparência facial característica e anomalias nos ossos, nos olhos, no fígado e no baço, por vezes acompanhadas por atraso mental.

A causa subjacente deste grupo de perturbações é a incapacidade de fraccionar e armazenar mucopolissacáridos, que são os componentes principais do tecido conjuntivo. Por conseguinte, o excesso de mucopolissacáridos passa para a circulação sanguínea e deposita-se em todo o organismo, e alguns são excretados na urina. Existem diferentes tipos de mucopolissacáridos e são necessários numerosos enzimas diferentes para os fraccionar. Portanto, existem diferentes tipos de mucopolissacaridose, cada um causado por uma anomalia genética específica que afecta um enzima em particular.

Sintomas e Diagnóstico

Habitualmente, os sintomas não se manifestam ao nascer. Durante a infância e a meninice, a baixa estatura e o crescimento anormal dos ossos, a pilosidade e o desenvolvimento anormal são evidentes. A cara pode apresentar uma aparência tosca, com lábios grossos, boca aberta e nariz achatado. Dependendo do tipo de mucopolissacaridose, algumas crianças afectadas apresentam inteligência normal e outras parecem normais quando nascem, mas gradualmente desenvolvem atraso mental num período de vários anos. Em alguns casos, os olhos vêem-se afectados, causando córnea nublosa e dificuldades visuais. Outros membros da família podem sofrer também de mucopolissacaridose.

O médico estabelece o diagnóstico segundo a sintomatologia. As mucopolissacaridoses também podem ser diagnosticadas antes do nascimento por meio de amniocentese ou estudos de pilosidades coriónicas, através dos quais se extraem amostras e se controlam para detectar uma actividade enzimática anormal. Podem realizar-se análises de urina depois do nascimento. Contudo, os resultados destas provas são em geral pouco exactos e exige-se então uma análise de sangue ou outros exames para confirmar o diagnóstico. As radiografias para detectar anomalias ósseas também são úteis no diagnóstico.

Prognóstico e Tratamento

O prognóstico depende do tipo de mucopolissacaridose. Alguns tipos causam morte precoce.

Actualmente, não existe tratamento médico. As tentativas de substituição do enzima anormal apenas tiveram um êxito limitado e temporário. O transplante de medula óssea pode produzir algumas melhoras. Mas, em geral, causa a morte ou a incapacidade, e o tratamento ainda continua a ser polémico.

Osteocondrodisplasias

As osteocondrodisplasias são um grupo de perturbações hereditárias nas quais os ossos ou cartilagens crescem de forma anormal; portanto, o esqueleto apresenta um mau desenvolvimento.

Muitos tipos de osteocondrodisplasia causam baixa estatura (nanismo). Dos diversos tipos de nanismo, a acondroplasia é a mais frequente com membros curtos. Produz-se em 1 de cada 25 000 ou 40 000 nascidos vivos, afectando ambos os sexos e todos os grupos raciais.

Sintomas

Cada tipo apresenta uma sintomatologia diferente. Os sintomas de acondroplasia são, por exemplo, membros curtos, genu varum, rosto grande, nariz com depressão e costas arqueadas.

As perturbações esqueléticas, como a luxação da anca, são características de todas as osteocondrodisplasias. Em alguns tipos, uma anomalia da segunda vértebra da coluna (hipoplasia do processo odontóide) produz uma deslocação da primeira vértebra e a compressão da espinal medula, o que pode causar a morte imediata.

Diagnóstico e Tratamento

É necessário estabelecer um diagnóstico preciso, porque cada tipo é causado por uma anomalia genética variada, evolui de forma diversa e tem um prognóstico diferente. Em alguns casos é possível o diagnóstico antes do nascimento por meio da observação directa do feto com um aparelho de fibra óptica (fetoscópio) ou com uma ecografia. Se uma pessoa com osteocondrodisplasia ou com parentes próximos que tenham uma destas perturbações deseja ter filhos, a assistência genética é útil para determinar o risco hereditário.

Quando os problemas articulares afectam gravemente os movimentos, a articulação pode por vezes ser substituída por uma artificial. Uma segunda vértebra anormal deve ser estabilizada cirurgicamente para prevenir a lesão da espinal medula.

Osteopetrose

A osteopetrose (ossos de mármore) é uma perturbação hereditária que aumenta a densidade dos ossos e causa anomalias esqueléticas.

Algumas das osteopetroses causam uma ligeira incapacidade; outras são progressivas e mortais. Em alguns tipos, não aparecem sintomas imediatos (manifestação tardia), mas, noutros, estes iniciam-se já na infância (manifestação precoce).

A maioria dos tipos de osteopetrose não tem tratamento específico. A cirurgia pode ser necessária para aliviar a alta pressão cerebral causada por anomalias do crânio. Os orifícios ósseos, através dos quais os nervos emergem do crânio, podem crescer de maneira excessiva, comprimindo os nervos, situação em que poderá ser necessário intervir cirurgicamente para os libertar. Os dentes podem deslocar-se, impedindo o fecho apropriado da boca (má oclusão), o que pode ser corrigido com tratamento ortodôntico. A cara pode torcer-se pelo crescimento excessivo dos ossos, o que gera por vezes problemas psicológicos.

Tipos de manifestação tardia: Os sintomas aparecem na infância, na adolescência ou na juventude. A doença de Albers-Schönberg, uma forma ligeira do tipo de manifestação tardia, pode ser assintomática. Esta forma é relativamente frequente em muitos países e em muitos grupos étnicos. Habitualmente, o esqueleto é normal no nascimento, mas a densidade óssea aumenta com a idade. Chega-se muitas vezes ao diagnóstico por casualidade, quando se realiza uma radiografia por qualquer outra razão e se detecta uma alta densidade óssea. A aparência facial, a estrutura corporal, o grau de desenvolvimento intelectual e o tempo de vida são normais e a saúde, em geral, é boa. De vez em quando, a paralisia facial ou a surdez podem ser o resultado da compressão de um nervo devido ao crescimento ósseo excessivo. Pode desenvolver-se também anemia ligeira.

Tipo de manifestação precoce: A osteopetrose sintomática precoce é uma perturbação pouco frequente, potencialmente mortal nas crianças. Os sintomas compreendem: escasso crescimento e pouco aumento de peso (incapacidade de desenvolvimento), tendência para a contusão, sangramentos anormais e anemia. O fígado e o baço podem aumentar de tamanho, e os nervos que chegam aos olhos e à cara podem sofrer lesões. Durante o primeiro ano de vida é frequente a morte por anemia, por infecção generalizada ou por hemorragias. As radiografias revelam um aumento geral da densidade óssea, que piora com o tempo. O transplante de medula óssea parece ter sido eficaz em algumas crianças, mas desconhece-se o prognóstico a longo prazo.