DOENÇAS
Doenças das Articulações e do Tecido Conjuntivo: Artrite Reumatóide

A artrite reumatóide é uma doença auto-imune em que se inflamam simetricamente as articulações, incluindo habitualmente as das mãos e pés, originando inchaço, dor e muitas vezes levando à destruição definitiva do interior da articulação.

A artrite reumatóide também pode desencadear uma variedade de sintomas em todo o corpo. Desconhece-se a sua causa exacta, embora sejam muitos os vários factores (inclusive a predisposição genética) que podem influir na reacção auto-imune. Cerca de 1 % da população sofre desta doença, que afecta as mulheres duas ou três vezes mais frequentemente que os homens. A artrite reumatóide apresenta-se em primeiro lugar em indivíduos entre os 25 e os 50 anos de idade, mas pode fazê-lo em qualquer idade. Em alguns casos, a doença resolve-se de forma espontânea e o tratamento alivia sintomas em três de cada quatro pessoas. Contudo, pelo menos 1 em cada 10 pessoas fica incapacitada.

Nesta doença, o sistema imunitário ataca o próprio tecido que reveste e protege as articulações. Finalmente, a cartilagem, o osso e os ligamentos da articulação deterioram-se, provocando a formação de cicatrizes dentro da articulação, que se deteriora a um ritmo muito variável.

Artrite reumatóide: aspecto das mãos:

1- desvio dos dedos;
2-dedos em martelo;
3-dedos em colo de cisne

Sintomas

A artrite reumatóide pode iniciar-se de forma súbita com a inflamação de muitas articulações ao mesmo tempo, mas, com maior frequência, começa de forma subtil, afectando diversas articulações gradualmente. A inflamação é em geral simétrica, quer dizer, quando afecta uma articulação de um lado do corpo, a correspondente do outro lado também é afectada. As pequenas articulações dos dedos das mãos, dos pés, dos pulsos, dos cotovelos e dos tornozelos costumam inflamar-se em primeiro lugar. As articulações inflamadas são em geral dolorosas e ficam com frequência rígidas, sobretudo logo depois de se levantar ou depois de um período de inactividade prolongado. Algumas pessoas sentem-se cansadas e fracas, especialmente durante as primeiras horas da tarde.

As articulações afectadas aumentam e podem deformar-se rapidamente. Também podem ficar rígidas numa posição (contracturas), o que impede que se estendam ou abram por completo. Os dedos tendem a dobrar-se em direcção ao dedo mindinho em cada mão, causando a deslocação dos tendões dos dedos. Os pulsos inchados podem dar lugar à síndroma do canal cárpico. Os quistos que se desenvolvem por trás dos joelhos afectados podem rebentar, causando dor e edema nas pernas. Cerca de 30 % a 40 % das pessoas que sofrem de artrite reumatóide apresenta tumefacções duras (nódulos) debaixo da pele, com frequência perto das zonas doentes.

A artrite reumatóide pode causar um pouco de febre e, em algumas ocasiões, uma inflamação dos vasos sanguíneos (vasculite), que provoca lesões dos nervos ou chagas nas pernas (úlceras). A inflamação das membranas que envolvem os pulmões (pleurisia) ou do invólucro do coração (pericardite), ou então a inflamação e as cicatrizes dos pulmões podem provocar dor torácica, dificuldade em respirar e uma função cardíaca anormal. Algumas pessoas desenvolvem gânglios linfáticos inflamados, a síndroma de Sjögren ou uma inflamação ocular.

A doença de Still é uma variante da artrite reumatóide em que aparecem em primeiro lugar febre alta e outros sintomas generalizados.

Diagnóstico

Pode ser difícil distinguir a artrite reumatóide das muitas outras doenças que podem causar artrite. As doenças que se parecem em alguns aspectos com a artrite reumatóide são: a febre reumática aguda, a artrite causada por gonococos, a doença de Lyme, a síndroma de Reiter, a artrite psoriática, a espondilite anquilosante, a gota, a pseudogota e a artrose.

A artrite reumatóide pode produzir sintomas muito característicos. Contudo, pode ser necessária uma análise do líquido que se extrai da articulação com uma agulha ou então uma biopsia (extracção de uma amostra de tecido que se examina ao microscópio) dos nódulos para estabelecer o diagnóstico. As mudanças características nas articulações podem ser detectadas nas radiografias.

Algumas características típicas da artrite reumatóide podem observar-se nos resultados dos exames laboratoriais. Por exemplo, 9 de cada 10 pessoas que sofrem de artrite reumatóide apresentam uma velocidade de sedimentação dos glóbulos vermelhos elevada. A maioria tem uma anemia ligeira. Em raras ocasiões, o valor dos glóbulos brancos é anormalmente baixo. Neste último caso, se o indivíduo também apresenta um baço grande e sofre de artrite reumatóide, diz-se que sofre da doença denominada de Flety.

A maioria das pessoas com artrite reumatóide tem anticorpos característicos no sangue. Sete em cada dez indivíduos têm um anticorpo chamado factor reumatóide. Este factor também se apresenta noutras doenças (como em doenças crónicas do fígado e algumas infecções), embora em alguns casos este factor apareça sem qualquer outra evidência de doença.

Em geral, quanto mais alto é o valor do factor reumatóide no sangue, mais grave será a artrite reumatóide e pior o prognóstico. O valor do factor reumatóide pode diminuir quando as articulações estão menos inflamadas e aumentar ao verificar-se o surto inflamatório.

Tratamento

Existem vários tratamentos, desde as medidas clássicas e simples como o repouso e a nutrição adequada, até aos medicamentos e a cirurgia. O tratamento inicia-se com as medidas menos agressivas, evoluindo até às mais agressivas caso seja necessário.

Um princípio básico do tratamento é o repouso da articulação afectada, dado que usá-la piora a inflamação. Os períodos regulares de repouso servem para aliviar a dor. Por vezes, um breve repouso absoluto na cama ajuda a aliviar um surto grave na sua etapa mais activa e dolorosa. Podem usar-se talas para imobilizar e proporcionar descanso a uma ou várias articulações, mas serão necessários alguns movimentos sistemáticos das mesmas para prevenir a rigidez.

É aconselhável seguir uma dieta regular e saudável. O aumento dos sintomas aparece em alguns casos depois do consumo de certos alimentos. Uma dieta rica em peixe e óleos vegetais, mas pobre em carne vermelha, pode ter leves efeitos benéficos sobre a inflamação.

As principais categorias de medicamentos usados para tratar a artrite reumatóide são os anti-inflamatórios não esteróides (AINE), os medicamentos de acção retardada, os corticosteróides e os medicamentos imunossupressores. Em geral, quanto mais forte é o medicamento, maiores são os seus efeitos secundários potenciais. Por isso exige-se um acompanhamento muito rigoroso.

Medicamentos anti-inflamatórios não esteróides

Os anti-inflamatórios não esteróides (Ver secção 2, capítulo 13) e (Ver secção 6, capítulo 61), como a aspirina e o ibuprofeno, são os mais utilizados, porque reduzem o inchaço nas articulações afectadas e acalmam a dor. A aspirina é a pedra angular tradicional do tratamento da artrite reumatóide; contudo, os novos medicamentos anti-inflamatórios não esteróides podem ter menos efeitos secundários e são, em geral, mais fáceis de administrar, embora sejam mais caros.

Geralmente o tratamento de aspirina inicia-se com 1 comprimido (325 mg) quatro vezes por dia, mas a dose pode ser aumentada até se obter o alívio suficiente. O zumbido nos ouvidos é um efeito colateral que indica que a dose é demasiado elevada. As queixas de estômago (um efeito secundário frequente nas doses elevadas), assim como as úlceras podem ser prevenidas ingerindo alimentos ou tomando antiácidos ou outros medicamentos ao mesmo tempo. O misoprostol pode ser útil para prevenir a irritação do revestimento do estômago e a formação de úlceras do estômago (gástricas) em pessoas com alto risco de manifestar tais afecções, mas por sua vez pode causar diarreias e, além disso, não evita as náuseas ou as dores abdominais que resultam da ingestão de aspirina ou outros medicamentos anti-inflamatórios não esteróides.

Em caso de intolerância à aspirina, experimentam-se outros medicamentos anti-inflamatórios não esteróides. Contudo, todos eles podem causar perturbações estomacais e estão contra-indicados em pacientes com úlceras activas do tracto gastro-intestinal (pépticas). Outros efeitos secundários menos frequentes são cefaleias, confusão, aumento da pressão arterial, tumefacção (edema) e, por vezes, doença renal.

Medicamentos de acção retardada

Os medicamentos de acção retardada alteram em certas ocasiões o curso da doença, embora possa ser necessário um tratamento de vários meses (cujos efeitos secundários podem ser perigosos) para se verificar alguma melhoria. O médico deve vigiar e fazer um acompanhamento do tratamento. Estes medicamentos prescrevem-se se os anti-inflamatórios não esteróides não foram eficazes ao fim de dois ou três meses de tratamento ou no caso de um progresso rápido da doença. Os medicamentos de acção retardada que são utilizados actualmente são a penicilamina, a hidroxicloroquina e a sulfasalazina.

Os compostos de ouro (que costumam atrasar o aparecimento das deformações ósseas) também podem causar uma remissão temporária da doença. Estes compostos administram-se em injecções semanais, embora se disponha de uma preparação que se administra por via oral. As injecções semanais mantêm-se até se ter administrado um total de um grama ou até ao aparecimento de efeitos secundários ou de uma melhoria significativa. Se o medicamento for eficaz, a frequência das injecções pode ser diminuída gradualmente. A melhoria pode perdurar vários anos graças a uma dose de manutenção.

Os compostos de ouro costumam afectar vários órgãos de forma adversa, daí que estejam contra-indicados em pessoas que sofram de doenças hepáticas ou renais graves, ou certas alterações do sangue. Por isso, devem-se realizar análises de sangue e urina antes de se iniciar o tratamento, e com frequência durante o mesmo (até uma vez por semana). Os efeitos secundários destes medicamentos consistem em erupções potencialmente perigosas, ardores e diminuição das células do sangue. Com menor frequência, os compostos de ouro afectam o fígado, os pulmões e os nervos; raramente causam diarreias. O tratamento suspende-se se aparecer algum destes graves efeitos secundários.

A penicilamina tem efeitos benéficos semelhantes aos dos compostos de ouro e pode ser utilizada quando estes não são eficazes ou quando causam efeitos secundários intoleráveis. A dose é aumentada gradualmente até se verificarem melhorias. Os efeitos secundários são, entre outros, a inibição da formação de glóbulos vermelhos na medula óssea, problemas renais, doença muscular, erupções e mau sabor na boca. O tratamento deve ser interrompido no caso de aparecer algum destes sintomas. A penicilamina também costuma causar algumas perturbações, como a miastenia grave, a síndroma de Goodpasture e uma síndroma parecida com o lúpus. Durante o tratamento, as análises de sangue e urina efectuam-se todas as semanas ou de 4 em 4 semanas.

Para o tratamento da artrite reumatóide menos grave utiliza-se a hidroxicloroquina de preferência a outros compostos como o ouro ou a penicilamina. Os seus efeitos secundários são geralmente ligeiros (erupções, dores musculares e problemas oculares). Contudo, alguns problemas oculares costumam ser permanentes, pelo que os indivíduos que tomam hidroxicloroquina devem recorrer ao oftalmologista antes de iniciar o tratamento e consultá-lo todos os 6 meses durante o mesmo. Se ao fim de 6 meses não se observar nenhuma melhoria com o medicamento, interrompe-se o tratamento; de contrário, pode-se prolongar o tempo que for necessário.

A sulfasalazina prescreve-se cada vez mais para a artrite reumatóide, aumentando-se a dose de forma gradual. A melhoria costuma verificar-se ao cabo de 3 meses. Contudo, assim como outros medicamentos de acção retardada, costuma causar problemas de estômago, problemas hepáticos, alterações das células sanguíneas e erupções cutâneas.

Corticosteróides

Os corticosteróides (como a prednisona) são medicamentos de uma eficácia surpreendente para reduzir a inflamação em qualquer parte do corpo. Apesar de os corticosteróides serem eficazes em tratamentos de curta duração, a sua eficiência tende a diminuir com o tempo, enquanto a artrite reumatóide, em geral, permanece activa durante anos. Estes medicamentos não costumam atrasar a progressão da doença; além disso, o uso prolongado de corticosteróides implica invariavelmente muitos efeitos secundários, afectando quase todos os órgãos do corpo.

Os efeitos secundários mais frequentes são adelgaçamento da pele, hematomas, osteoporose, aumento da pressão arterial, aumento do açúcar no sangue e cataratas. Por conseguinte, estes medicamentos reservam-se para o tratamento imediato dos surtos quando várias articulações estão afectadas ou quando os outros medicamentos se revelaram ineficazes. Também são úteis para tratar a inflamação em pontos diferentes das articulações, por exemplo na membrana que envolve os pulmões (pleurite) ou no invólucro do coração (pericardite). Na maioria dos casos, usa-se a dose mínima eficaz devido ao risco de efeitos secundários. Para um alívio rápido e a curto prazo, os corticosteróides podem ser injectados directamente na articulação afectada. Contudo, a longo prazo costumam acelerar o processo de deterioração, especialmente quando se usa de modo excessivo a articulação (que não dói durante algum tempo devido à administração frequente de injecções).

Medicamentos imunossupressores

Os medicamentos imunossupressores (metotrexato, azatioprina e ciclofosfamida) são eficazes no tratamento das formas graves de artrite reumatóide. Suprimem a inflamação, pelo que os corticosteróides podem ser administrados em doses mínimas e inclusive ser evitados.

Contudo, estes medicamentos têm efeitos secundários potencialmente mortais, como doenças do fígado, inflamação dos pulmões, aumento da susceptibilidade às infecções e supressão da produção de células sanguíneas na medula óssea; além disso, a ciclofosfamida pode produzir hemorragia da bexiga urinária. Por fim, tanto a azatioprina como a ciclofosfamida podem aumentar o risco de cancro.

O metotrexato, administrado por via oral uma vez por semana, usa-se cada vez com maior frequência para o tratamento da artrite reumatóide nas suas primeiras etapas, já que se trata de um medicamento de acção rápida, surtindo efeito, em alguns casos, depois de várias semanas. Também se pode administrar este medicamento antes de prescrever medicamentos de acção retardada em caso de artrite grave. As pessoas tratadas com metotrexato toleram bem o medicamento, mas devem ser rigorosamente controladas. Devem evitar-se as bebidas alcoólicas para minimizar o risco de lesão do fígado. Pode-se prescrever ciclosporina, que suprime os linfócitos (um tipo de glóbulo branco), quando outros medicamentos são ineficazes no tratamento de uma artrite grave.

Outras terapias

Um programa de tratamento para a artrite reumatóide, juntamente com os medicamentos para reduzir a inflamação das articulações, pode incluir exercício, fisioterapia, aplicação de calor nas articulações inflamadas e por vezes cirurgia. O exercício suave evita a rigidez das articulações inflamadas. Ao diminuir a inflamação, os exercícios activos e regulares podem ser úteis, sem que a pessoa chegue ao extremo de se cansar. Em alguns casos, a prática de exercícios na água pode ser mais fácil.

O tratamento das articulações rígidas consiste na prática de exercícios intensivos e em algumas ocasiões no uso de talas para estender gradualmente a articulação. Se os medicamentos não foram eficazes, a cirurgia pode ser necessária. A substituição cirúrgica das articulações do joelho ou da anca é o modo mais eficaz para restaurar a mobilidade e o funcionamento, quando a doença articular se encontra num estado avançado.

Também é possível a sua extracção ou fusão, especialmente no pé, para tornar a marcha menos dolorosa. É possível fundir o polegar e assim permitir que a pessoa possa utilizá-lo para segurar. Também se pode fundir as vértebras instáveis do extremo superior do pescoço para que não comprimam a espinal medula.

As pessoas incapacitadas por uma artrite reumatóide podem usar uma variedade de ajudas para levar a cabo as tarefas diárias. Por exemplo, existe calçado ortopédico especialmente modificado que pode ajudar a caminhar com menos dor e dispositivos como empunhaduras que reduzem a necessidade de apertar demasiado a mão.